‘Ley de Medios’ cria novo e avan\u00e7ado marco regulat\u00f3rio<\/span><\/p>\nUm dos principais problemas do sistema de comunica\u00e7\u00e3o argentino pode come\u00e7ar a ter uma solu\u00e7\u00e3o com a proposta de Lei de Servi\u00e7os de Comunica\u00e7\u00e3o Audiovisual – aprovada pela C\u00e2mara dos Deputados daquele pa\u00eds na \u00faltima quinta-feira (17). Al\u00e9m de propor a cria\u00e7\u00e3o de \u00f3rg\u00e3os de fiscaliza\u00e7\u00e3o e controle social da m\u00eddia, definir limites para a publicidade, instituir a classifica\u00e7\u00e3o indicativa de programas e proibir o uso de canais de r\u00e1dio e TV por pol\u00edticos e detentores de cargos p\u00fablicos, entre outras medidas, o objetivo central da chamada “Ley de Medios” \u00e9 criar mecanismos para combater a concentra\u00e7\u00e3o midi\u00e1tica do pa\u00eds.<\/p>\n
O projeto de lei, que se encontra no Senado argentino, prev\u00ea a cria\u00e7\u00e3o de um limite de licen\u00e7as para explora\u00e7\u00e3o dos servi\u00e7os audiovisuais. Cada empresa passaria a poder usar, no m\u00e1ximo, dez concess\u00f5es em TV aberta ou a cabo. Atualmente, esse limite \u00e9 de 24 outorgas. As empresas teriam um ano para se adequar \u00e0 norma. Tamb\u00e9m o prazo das licen\u00e7as seria diminu\u00eddo, de 15 para dez anos.<\/p>\n
Outra proposta<\/strong> \u2013 e talvez a mais ousada entre as apresentadas pelo governo argentino \u2013 \u00e9 a reparti\u00e7\u00e3o do espectro destinado ao r\u00e1dio em tr\u00eas partes iguais. Uma delas ficaria para uso da iniciativa privada com fins lucrativos, outra para os operadores privados sem fins lucrativos (igrejas, associa\u00e7\u00f5es comunit\u00e1rias, sindicatos, universidades, funda\u00e7\u00f5es) e a terceira para o Estado.<\/p>\nO projeto tamb\u00e9m imp\u00f5e restri\u00e7\u00f5es para evitar a concentra\u00e7\u00e3o dos meios locais, como a impossibilidade de um mesmo concession\u00e1rio operar mais de uma licen\u00e7a em frequ\u00eancia de r\u00e1dio AM e mais de duas em FM. Al\u00e9m disso, o processo de concess\u00e3o e renova\u00e7\u00e3o de outorgas seria mais r\u00edgido. Institui-se, por exemplo, a necessidade de audi\u00eancias p\u00fablicas nos locais de presta\u00e7\u00e3o de servi\u00e7o das emissoras para avaliar seus desempenhos.<\/p>\n
O governo de Cristina Kirchner tamb\u00e9m pretende utilizar a digitaliza\u00e7\u00e3o das transmiss\u00f5es de radiodifus\u00e3o para ampliar sua reforma do sistema. Como isso possibilita a divis\u00e3o de um mesmo canal em v\u00e1rias programa\u00e7\u00f5es, a lei prev\u00ea que seja adotada a multiprograma\u00e7\u00e3o. \u201cA digitaliza\u00e7\u00e3o deve levar mais atores no mercado, n\u00e3o menos\u201d, enfatiza o texto do projeto.<\/p>\n
Al\u00e9m desses pontos, tamb\u00e9m se pretende evitar o excesso de conte\u00fados estrangeiros nos ve\u00edculos de comunica\u00e7\u00e3o. O texto aprovado pelos deputados prev\u00ea que no r\u00e1dio, por exemplo, 30% do que for veiculado deve ser de origem argentina. Na TV, a produ\u00e7\u00e3o nacional deve alcan\u00e7ar 60% de toda a programa\u00e7\u00e3o. Isso quando as emissoras estiverem em cidades com mais de 600 mil habitantes.<\/p>\n
\u201cGeralmente n\u00e3o \u00e9 um problema nos canais de TV aberta, mas na Argentina a televis\u00e3o a cabo \u00e9 muito forte. Em muitos lugares, se voc\u00ea n\u00e3o \u00e9 assinante do cabo, n\u00e3o assiste televis\u00e3o. A id\u00e9ia \u00e9 gerar condi\u00e7\u00f5es para cria\u00e7\u00e3o e fomento da produ\u00e7\u00e3o nacional, algo que dar\u00e1 muito trabalho\u201d, avalia o professor e pesquisador da Universidade de Buenos Aires Santiago Marino.<\/p>\n
A propriedade cruzada dos meios de comunica\u00e7\u00e3o tamb\u00e9m \u00e9 atacada pelo projeto. Empresas de radiodifus\u00e3o n\u00e3o poder\u00e3o operar distribuidoras de TV a cabo em uma mesma localidade e vice-versa.<\/p>\n
Controle Social<\/strong><\/p>\nUma das grandes for\u00e7as do projeto \u00e9 conseguir articular em um mesmo texto praticamente todas as nuances de um sistema de comunica\u00e7\u00e3o audiovisual. Isso inclui est\u00e2ncias de promo\u00e7\u00e3o e fiscaliza\u00e7\u00e3o da nova regula\u00e7\u00e3o proposta. Por isso, o projeto prop\u00f5e a cria\u00e7\u00e3o de alguns organismos novos, voltados especificamente para este fim. Um deles \u00e9 uma estrutura designada Autoridade Federal de Servi\u00e7os de Comunica\u00e7\u00e3o Audiovisual, encarregada de aplicar a lei. Entre suas fun\u00e7\u00f5es, est\u00e1 a aprova\u00e7\u00e3o de projetos t\u00e9cnicos das esta\u00e7\u00f5es de radiodifus\u00e3o junto com a Autoridade de Aplica\u00e7\u00e3o de Telecomunica\u00e7\u00f5es. Ela tamb\u00e9m ter\u00e1 como responsabilidade aplicar san\u00e7\u00f5es em caso de viola\u00e7\u00e3o da lei, sob supervis\u00e3o judicial.<\/p>\n
Tamb\u00e9m est\u00e1 proposto no texto a cria\u00e7\u00e3o de uma Defensoria do P\u00fablico, \u00f3rg\u00e3o voltado a receber den\u00fancias e reclama\u00e7\u00f5es, criar espa\u00e7os de debate sobre os meios de comunica\u00e7\u00e3o e representar os interesses do p\u00fablico e da comunidade, isolada ou conjuntamente, em um recurso administrativo ou judicial.<\/p>\n
O projeto tamb\u00e9m d\u00e1 conta de reestruturar a comunica\u00e7\u00e3o estatal. Os ve\u00edculos de comunica\u00e7\u00e3o do Estado deixariam de funcionar isoladamente e seriam aglutinados em torno de uma nova empresa, a Radio y Televisi\u00f3n Argentina Sociedad del Estado. Ela seria dirigida por um conselho de sete membros.<\/p>\n
Avalia\u00e7\u00e3o<\/strong><\/p>\nNa avalia\u00e7\u00e3o do professor da Universidade Federal Fluminense D\u00eanis de Moraes, o projeto de lei proposto pelo governo argentino \u00e9, ao lado da lei de radiodifus\u00e3o comunit\u00e1ria aprovada no Uruguai, o mais avan\u00e7ado da Am\u00e9rica Latina. \u201c\u00c9 uma interven\u00e7\u00e3o profunda\u201d, afirma ele, que \u00e9 autor do rec\u00e9m-lan\u00e7ado \u201cA Batalha da M\u00eddia\u201d, em que analisa as propostas dos governos progressistas latino-americanos referentes \u00e0 comunica\u00e7\u00e3o.<\/p>\n
Moraes destaca duas quest\u00f5es fundamentais para ter se chegado a constru\u00e7\u00e3o desse projeto. A primeira foi a vontade pol\u00edtica do governo. Moraes acredita que a presidente compreendeu que a antiga lei que regulava o setor (a Lei 22.285 de 1980) \u00e9 anacr\u00f4nica e beneficia os grandes grupos de m\u00eddia. \u201c\u00c9 uma vontade progressista de enfrentamento aos grupos midi\u00e1ticos. A presidente vai mexer na j\u00f3ia da coroa dessas corpora\u00e7\u00f5es\u201d, avalia o professor, que aproveita para criticar o governo brasileiro pela pouca disposi\u00e7\u00e3o em lidar com os problemas da nossa m\u00eddia.<\/p>\n
O segundo ponto foi a exist\u00eancia de uma grande mobiliza\u00e7\u00e3o da sociedade argentina que deu suporte \u00e0s propostas contidas no projeto de Lei de Servi\u00e7os de Comunica\u00e7\u00e3o Audiovisual. Para o professor, al\u00e9m do campo da comunica\u00e7\u00e3o, foi fundamental o envolvimento de outros setores, como centrais sindicais, igrejas e associa\u00e7\u00f5es profissionais. \u201cFoi uma coaliz\u00e3o de interesses progressistas. N\u00e3o adianta acreditar que apenas as entidades que lutam pela democratiza\u00e7\u00e3o da comunica\u00e7\u00e3o v\u00e3o conseguir dobrar o poderio dos grandes grupos de m\u00eddia\u201d, opina.<\/p>\n
O projeto foi fortemente influenciado por um grupo de entidades da sociedade civil denominado Coalici\u00f3n por uma Radiodifusi\u00f3n Democr\u00e1tica (Coaliz\u00e3o por uma Radiodifus\u00e3o Democr\u00e1tica). Boa parte das propostas e inclusive as justificativas apresentadas pela Presid\u00eancia da Rep\u00fablica est\u00e3o baseadas em documentos da coaliz\u00e3o, em especial \u201c21 Puntos B\u00e1sicos por el Derecho a la Comunicaci\u00f3n\u201d (21 Pontos B\u00e1sicos pelo Direito \u00e0 Comunica\u00e7\u00e3o).<\/p>\n
Para divulgar a \u201clei dos meios de comunica\u00e7\u00e3o\u201d, o governo argentino criou uma p\u00e1gina na internet. Com o sugestivo nome \u201cHablemos todos\u201d – ou \u201cFalemos todos\u201d.<\/p>\n
SAIBA MAIS<\/strong><\/p>\nOutros pontos importantes do projeto:<\/strong><\/p>\n– A proposta apresentada pela Presid\u00eancia da Rep\u00fablica tem inspira\u00e7\u00e3o em leis da Fran\u00e7a, It\u00e1lia, Inglaterra, Canad\u00e1 e Estados Unidos, al\u00e9m das propostas feitas pela Coalici\u00f3n por uma Radiodifusi\u00f3n Democr\u00e1tica.<\/p>\n
– O texto fala em servi\u00e7os audiovisuais porque regula o sistema independente da plataforma em que os diferentes servi\u00e7os s\u00e3o operados (pelo ar, atrav\u00e9s do cabo, via sat\u00e9lite, em tecnologia anal\u00f3gica ou digital). O projeto deixa de lado o conceito de radiodifus\u00e3o. \u201cConte\u00fados audiovisuais id\u00eanticos ou similares devem ser regulados pelo mesmo marco regulat\u00f3rio, independente da tecnologia de transmiss\u00e3o\u201d, diz o texto.<\/p>\n
– Prop\u00f5e criar pol\u00edticas para garantir que bibliotecas, museus e arquivos possam oferecer o conte\u00fado dispon\u00edvel nos diferentes servi\u00e7os de distribui\u00e7\u00e3o.<\/p>\n
– Das 22h at\u00e9 \u00e0 meia-noite, a programa\u00e7\u00e3o das TVs deve estar voltada para maiores de 13 anos. Desse hor\u00e1rio at\u00e9 as 6h, podem ser exibidos conte\u00fados classificados como para pessoas com mais de 18 anos.<\/p>\n
– Ser\u00e1 elaborada uma lista anual de eventos de interesse geral, para o qual o \u201cexerc\u00edcio dos direitos exclusivos devem ser justos e n\u00e3o discriminat\u00f3rios\u201d. Isso vai permitir, por exemplo, que competi\u00e7\u00f5es esportivas sejam transmitidas em canal aberto, o que n\u00e3o ocorre at\u00e9 hoje porque os direitos de transmiss\u00e3o s\u00e3o exclusivos de operadoras de TV a cabo.<\/p>\n
– A publicidade dirigida \u00e0s crian\u00e7as n\u00e3o deve incitar a compra de produtos. Ali\u00e1s, o limite para toda a publicidade em uma programa\u00e7\u00e3o qualquer n\u00e3o deve ultrapassar o m\u00e1ximo de 12 minutos por hora, o que equivale a 20% do tempo di\u00e1rio de um canal.<\/p>\n
– O projeto reserva uma freq\u00fc\u00eancia na TV aberta para a Universidade Nacional.<\/p>\n