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{"id":210363,"date":"2013-01-15T10:47:04","date_gmt":"2013-01-15T12:47:04","guid":{"rendered":"http:\/\/www.bitscaverna.com.br\/luissucupira\/?p=210363"},"modified":"2013-01-16T10:18:28","modified_gmt":"2013-01-16T12:18:28","slug":"os-campos-de-concentracao-que-mataram-centenas-de-milhares-de-cearenses-entre-os-anos-1915-e-1932","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/os-campos-de-concentracao-que-mataram-centenas-de-milhares-de-cearenses-entre-os-anos-1915-e-1932\/","title":{"rendered":"Os Campos de concentra\u00e7\u00e3o que mataram centenas de milhares de cearenses entre os anos 1915 e 1932."},"content":{"rendered":"

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No Cear\u00e1, 28 anos antes de Hitler, essa foi uma solu\u00e7\u00e3o elaborada pelo governo para evitar que flagelados famintos fugindo do sert\u00e3o semi-\u00e1rido chegassem a Fortaleza.<\/figcaption><\/figure>\n

\u201cSeco, meu Deus, s\u00f3 o fiapinho de gente, despencou em cima da carro\u00e7a, j\u00e1 se tremendo todinho e ali mesmo morreu\u201d, contava Jo\u00e3o Patriolino de Menezes, av\u00f4 de Xico S\u00e1, sobre a morte do irm\u00e3o, Francisco, durante a constru\u00e7\u00e3o de um a\u00e7ude na Batateira, nos arredores da cidade do Crato, no Cear\u00e1. Chico Patriolino, como seu tio era chamado, nascido no vizinho munic\u00edpio de Exu, em Pernambuco, era um dos alistados do\u00a0campo de concentra\u00e7\u00e3o do Cariri, o maior do territ\u00f3rio cearense. Tinha 22 anos quando foi v\u00edtima da trag\u00e9dia. O ano \u00e9 1915 e o cen\u00e1rio uma das mais terr\u00edveis secas por que passou o Estado do Cear\u00e1.<\/strong><\/em><\/p>\n

Se voc\u00ea pensava que a ideia de adotar os campos de concentra\u00e7\u00e3o como solu\u00e7\u00e3o final foi executada pela primeira vez pelos nazistas, enganou-se. No Cear\u00e1, 28 anos antes de Hitler, essa foi uma solu\u00e7\u00e3o elaborada pelo governo para evitar que flagelados famintos fugindo do sert\u00e3o semi-\u00e1rido chegassem a Fortaleza. Vicente a Concei\u00e7\u00e3o, personagem do romance O Quinze, da escritora Rachel de Queiroz pergunta a um sertanejo sobre os campos de concentra\u00e7\u00e3o. Eles n\u00e3o est\u00e3o falando dos campos da Segunda Guerra Mundial, mas dos criados e mantidos pelo governo cearense em 1915. O di\u00e1logo fala dos currais erguidos no Cear\u00e1 pelos governos estadual e federal para isolar os famintos da\u00a0seca de 1915.<\/p>\n

Os retirantes n\u00e3o podiam alcan\u00e7ar\u00a0Fortaleza, pois assim trariam \u201co caos, a mis\u00e9ria, a mol\u00e9stia e a sujeira\u201d, como informavam os boletins do poder p\u00fablico \u00e0 \u00e9poca. Naquele ano, criou-se o\u00a0campo de concentra\u00e7\u00e3o do Alagadi\u00e7o, nos arredores da capital cearense, hoje regi\u00e3o da Washington Soares (zona nobre da cidade) que foi cen\u00e1rio do livro de Rachel de Queiroz. Este campo chegou a juntar oito mil esfomeados, que recebiam alguma comida e permaneciam vigiados por soldados. A segrega\u00e7\u00e3o dos miser\u00e1veis era lei, mas chegou um momento em que o flagelo em massa era t\u00e3o chocante, pelas 150 mortes di\u00e1rias, que o governo do Estado ordenou, em 18 de dezembro 1915, de acordo com os jornais da \u00e9poca, a dispers\u00e3o dos flagelados, ou \u201cmolambudos\u201d, como eram tamb\u00e9m conhecidos.<\/p>\n

Segundo o historiador Marco Antonio Villa, autor de Vida e Morte no Sert\u00e3o, durante a\u00a0seca de 1915 teriam morrido pelo menos 100 mil nordestinos. Outros 250 mil migraram para escapar da \u201cvelha do chapel\u00e3o\u201d \u2013 como a\u00a0fome era conhecida no imagin\u00e1rio do semi-\u00e1rido. O medo das autoridades diante dos flagelados da\u00a0seca tinha um antecedente. Em 1877, uma leva de cerca de 110 mil famintos saiu dos sert\u00f5es e tomou as ruas de\u00a0Fortaleza, assombrando os moradores que viviam a ilus\u00e3o, importada de Paris, de urbanismo e civilidade.<\/p>\n

Rodolfo Te\u00f3filo e o relato das 400 mortes di\u00e1rias.<\/strong><\/p>\n

\"\"<\/a>
Rodolfo Te\u00f3filo: \u201cA peste e a fome matam mais de 400 por dia!”<\/figcaption><\/figure>\n

No livro \u2018A\u00a0Fome\u2019, o mais consistente relato sobre o cen\u00e1rio de 1877 nas ruas da capital, o cientista social e escritor Rodolfo Te\u00f3filo assim descreve o que viu: \u201cA peste e a\u00a0fome matam mais de 400 por dia! O que te afirmo \u00e9 que, durante o tempo em que estive parado em uma esquina, vi passar 20 cad\u00e1veres: e como seguem para a vala! Faz horror! Os que t\u00eam rede, v\u00e3o nela, suja, rota, como se acha; os que n\u00e3o a t\u00eam, s\u00e3o amarrados de p\u00e9s e m\u00e3os em um comprido pau e assim s\u00e3o levados para a sepultura. E as crian\u00e7as que morrem nos abarracamentos, como s\u00e3o conduzidas! Pela manh\u00e3 os encarregados de sepult\u00e1-las v\u00e3o recolhendo-as em um grande saco; e, ensacados os cad\u00e1veres, \u00e9 atado aquele sud\u00e1rio de grossa estopa a um pau e conduzido para a sepultura\u201d.<\/p>\n

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O cheiro de podrid\u00e3o e as mem\u00f3rias de um horror que virou ind\u00fastria<\/strong><\/p>\n

Foi em 1932 que o modelo de isolamento come\u00e7ava para valer. Na \u201cseca de quinze\u201d \u2013 como era chamada a estiagem \u2013 ainda n\u00e3o existia sequer a famosa \u201cind\u00fastria da\u00a0seca\u201d, como se convencionou chamar a ajuda do poder federal \u00e0s oligarquias nordestinas \u2013 diante das amea\u00e7as de saques e viol\u00eancia das legi\u00f5es de famintos, os grandes propriet\u00e1rios de terra sempre chantagearam o governo federal, principalmente a partir dos anos 1930, alocando recursos para a\u00a0regi\u00e3o que na maioria das vezes acabavam se revertendo em benef\u00edcio das pr\u00f3prias elites.<\/p>\n

\u201cDe longe eu sentia o cheiro de podrid\u00e3o, chegava a tapar as ventas. Era t\u00e3o forte o fedor que \u00e9 como se eu o sentisse hoje, mesmo eu estando com a mem\u00f3ria fraquinha, fraquinha\u201d, diz Manuel Concei\u00e7\u00e3o Rodrigues de S\u00e1, 87 anos, um rapaz de 15 anos durante a\u00a0seca<\/span> braba de 1932. Hoje, ele mora no sub\u00farbio de Juazeiro do Norte, no Cear\u00e1, terra do Padre C\u00edcero, personagem que j\u00e1 era celebrado como santo naquele tempo, pelas levas de famintos que buscavam por sua b\u00ean\u00e7\u00e3o. Manuel morava, ent\u00e3o, no munic\u00edpio de Serra Talhada, em Pernambuco. Trabalhava como tropeiro \u2013 tocava burros com carregamentos de cacha\u00e7a dos engenhos da\u00a0regi\u00e3o do Cariri, no sul do Cear\u00e1, para munic\u00edpios de Pernambuco e da Para\u00edba. \u201cEra num s\u00edtio ali perto do Crato, s\u00f3 vi uma vez de perto o\u00a0campo de concentra\u00e7\u00e3o, nunca mais tive coragem de passar junto. Pense num desmantelo! Gente apodrecendo de verdade parecia uns urubus quando o governo mandava comida\u201d, afirma o ex-mascate.<\/p>\n

O cearense do Cariri Miguel Arraes de Alencar, nascido em dezembro de 1917, na cidade do Araripe, governador de Pernambuco por tr\u00eas mandatos, relatou tamb\u00e9m lembran\u00e7as do\u00a0campo de concentra\u00e7\u00e3o do Crato, onde morou sua fam\u00edlia. \u201cA\u00a0seca braba de 32 \u00e9 muito forte em minha mem\u00f3ria. Um dia, quando ia estudar, me deparei com tr\u00eas homens presos. Eram flagelados do curral da concentra\u00e7\u00e3o. Foram presos como desordeiros, s\u00f3 porque ficaram revoltados com as injusti\u00e7as na distribui\u00e7\u00e3o de comida por l\u00e1\u201d, afirmou Arraes em conversa com este rep\u00f3rter, em 2002. \u201c\u00c9 uma lembran\u00e7a que guardo para sempre, as hist\u00f3rias vindas de l\u00e1 eram um horror danado.\u201d<\/p>\n

Falsa promessas de \u00e1gua de comida farta.<\/strong><\/p>\n

\"Campo<\/a>
Campo de concentra\u00e7\u00e3o cearense desativado e abandonado.<\/figcaption><\/figure>\n

Pelo\u00a0campo de concentra\u00e7\u00e3o do Crato passaram cerca de 65 mil pessoas durante aquela estiagem. Ali, o governo prometia comida, \u00e1gua, assist\u00eancia m\u00e9dica e oferta de trabalho. Na realidade n\u00e3o havia \u00e1gua tratada, nem comida para todos e muita gente morria literalmente de\u00a0fome ou doen\u00e7a e era sepultada ali mesmo. O campo se tornou um foco de tudo o que \u00e9 infec\u00e7\u00e3o. Em alguns dias, o n\u00famero de mortes de famintos alcan\u00e7ava a marca de 200. H\u00e1 registros de pelos menos outros cinco currais no estado do Cear\u00e1, localizados em Quixeramobim, Senador Pompeu, Cari\u00fas, Ipu, Quixad\u00e1 e o \u00faltimo nos arredores de\u00a0Fortaleza, como derradeira tentativa de evitar que os famintos convivessem com a popula\u00e7\u00e3o da capital.<\/p>\n

Entravam e n\u00e3o podiam mais sair<\/strong><\/p>\n

“Eram locais para onde grande parte dos retirantes foi recolhida a fim de receber do governo comida e assist\u00eancia m\u00e9dica. Dali n\u00e3o podiam sair sem autoriza\u00e7\u00e3o dos inspetores do campo. Havia guardas vigiando constantemente o movimento dos concentrados. Ali ficavam retidos milhares de retirantes a morrer de\u00a0fome e doen\u00e7as\u2019\u2019, diz a historiadora K\u00eania Rios, da PUC-SP.<\/p>\n

As estat\u00edsticas oficiais, que n\u00e3o conseguiam abarcar todos os alistados nos \u201ccurrais\u201d, d\u00e3o conta de 73.918 \u201cmolambudos\u201d nas seis \u00e1reas de confinamento \u2013 6.507 em Ipu; 1.800 em\u00a0Fortaleza; 4.542 em Quixeramobim; 16.221 em Senador Pompeu; 28.648 em Cari\u00fas e 16.200 no Crato, conforme relata uma das melhores fontes sobre o assunto, o livro Campos de Concentra\u00e7\u00e3o no Cear\u00e1 \u2013 Isolamento e Poder na\u00a0Seca de 1932, de K\u00eania Rios.<\/p>\n

Os famintos foram mandados a S\u00e3o Paulo para lutar na Revolu\u00e7\u00e3o de \u201832<\/strong><\/p>\n

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Sem ter a menor no\u00e7\u00e3o do que enfrentariam, muitos seguiram de navio e caminh\u00e3o para as trincheiras de S\u00e3o Paulo.<\/figcaption><\/figure>\n

Em 1932, em S\u00e3o Paulo, tropas revolucion\u00e1rias enfrentavam o Ex\u00e9rcito brasileiro num levante contra Get\u00falio Vargas, que assumira a presid\u00eancia em 1930. Quando a luta apertou, os governos federal e estadual, que haviam criado os campos de concentra\u00e7\u00e3o no Cear\u00e1, convocaram seus ocupantes para engrossar o caldo contra os paulistas. Para quem estava faminto e desabrigado, servir o Ex\u00e9rcito era a \u00fanica sa\u00edda entre esperar morrer de fome e escapar das balas.<\/p>\n

Sem ter a menor no\u00e7\u00e3o do que enfrentariam, muitos seguiram de navio e caminh\u00e3o para as trincheiras de S\u00e3o Paulo. O escritor paraibano Jos\u00e9 Am\u00e9rico de Almeida, ministro da Via\u00e7\u00e3o, respons\u00e1vel pela pol\u00edtica de combate \u00e0\u00a0seca no\u00a0Nordeste, foi um dos defensores da medida: \u201cO Norte veio para a trincheira impelido pela gratid\u00e3o e pelo instinto de conserva\u00e7\u00e3o, pois s\u00f3 no Cear\u00e1 o Minist\u00e9rio da Via\u00e7\u00e3o deu trabalho a 100 mil homens e 500 mil brasileiros foram salvos da\u00a0fome\u201d, disse, na \u00e9poca, ao jornal O Povo, de\u00a0Fortaleza. Detalhe: escapar da fome para morrer de frio ou por balas de fuzis.<\/p>\n

Segundo o jornal, em 19 de agosto, pouco mais de um m\u00eas do in\u00edcio dos combates, j\u00e1 haviam sido enviados pelo menos 1.200 cearenses para a linha de fogo, n\u00e3o pouparam nem crian\u00e7as e idosos. O jornal O Povo registrou os sofrimentos desses nordestinos em S\u00e3o Paulo, \u201csubmetidos \u00e0s mais duras humilha\u00e7\u00f5es\u201d. O jornal relatou que na capital paulista a popula\u00e7\u00e3o provocou depreda\u00e7\u00f5es e inc\u00eandios em lojas cujos propriet\u00e1rios eram migrantes do Cear\u00e1. Contam que os soldados da\u00a0seca n\u00e3o tinham treinamento adequado para quem ia a uma guerra, nenhuma experi\u00eancia militar e at\u00e9 o fardamento que utilizavam era inadequado para a\u00a0regi\u00e3o, o que fazia a tropa passar muito frio. Por\u00e9m, n\u00e3o h\u00e1 estat\u00edsticas sobre o n\u00famero de v\u00edtimas nordestinas na guerra vencida por Get\u00falio, mas estima-se que menos da metade retornou ao Cear\u00e1.<\/p>\n

A fome e o beato Z\u00e9 Louren\u00e7o<\/strong><\/p>\n

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O Caldeir\u00e3o da Santa Cruz do Deserto, a comunidade foi destru\u00edda e bombardeada<\/figcaption><\/figure>\n

Um sobrevivente da segrega\u00e7\u00e3o \u00e9 Antonio Siqueira da Silva, de 90 anos, que tinha 18 anos quando foi \u201cjogado\u201d com a fam\u00edlia \u2013 pai, m\u00e3e e mais 12 irm\u00e3os \u2013 no \u201ccurral dos flagelados\u201d do Crato. A fam\u00edlia havia mudado do munic\u00edpio de Quebrangulo, terra do escritor Graciliano Ramos, para Juazeiro do Norte, cidade hoje emendada ao Crato, em 1930. \u201cA gente veio por causa dos milagres do meu padim Ci\u00e7o. S\u00f3 se falava nas obras do \u2018meu padim\u2019 por esse mund\u00e3o todo afora. Ai meu pai pegou a penca de menino, botou em cima dos burros, e chegamos aqui em Juazeiro, pois l\u00e1 nas Alagoas n\u00e3o tinha mais como viver que preste\u201d, diz Silva, em depoimento para o projeto Nova Geografia da\u00a0Fome, do Centro Cultural Banco do\u00a0Nordeste. \u201cChegando aqui o meu padim nos botou l\u00e1 no s\u00edtio do beato Z\u00e9 Louren\u00e7o, onde tinha muita fartura. O mundo todo sem nada para comer e o beato l\u00e1 dando de comer a todo mundo, at\u00e9 irriga\u00e7\u00e3o j\u00e1 tinha.\u201d<\/p>\n

O Caldeir\u00e3o de Santa Cruz do Deserto e o bombardeio de inocentes desarmados<\/strong><\/p>\n

Seguidor do padre C\u00edcero, Louren\u00e7o (1872-1946), nascido na Para\u00edba, chegou a abrigar cerca de mil pessoas no come\u00e7o dos anos 1930. Conhecida como o Caldeir\u00e3o da Santa Cruz do Deserto, a comunidade foi destru\u00edda e bombardeada \u2013 a primeira vez que as For\u00e7as Armadas usaram avi\u00f5es para um massacre no\u00a0Brasil \u2013 em 1937, por ordem do ministro da Guerra Eurico Gaspar Dutra, durante o governo de Get\u00falio Vargas. O poder central, insuflado pelas autoridades cearenses, temia que o beato pudesse transformar o seu vilarejo em mais um Canudos, epis\u00f3dio que ainda assombrava os militares. No massacre, teriam morrido cerca de 700 pessoas. Louren\u00e7o escapou, fugindo pela Chapada do Araripe. Doente, morreria nove anos depois, em Exu (PE), munic\u00edpio nas cercanias do Crato.<\/p>\n

\u201cO s\u00edtio do beato foi ficando cheio de gente demais, ai meu pai achou melhor a gente escapar da\u00a0fome l\u00e1 no \u2018curral dos flagelados\u2019, pois o governo prometia muita esmola por l\u00e1\u201d, diz o sobrevivente do campo de concentra\u00e7\u00e3o Ant\u00f4nio da Silva. \u201cMas quem disse que as esmolas chegavam? L\u00e1 perdi foi seis irm\u00e3os, de\u00a0fome braba. Eu mesmo s\u00f3 escapei porque fugi com o resto, de madrugada, ainda lembro como se fosse hoje. Era uma catinga t\u00e3o feroz, meu filho, que nem dava pra dormir direito. E os urubus em cima, querendo arrancar as tripas dos falecidos.\u201d<\/p>\n

 <\/p>\n

\"\"<\/a>
Mais de dois milh\u00f5es de mortos: uma p\u00e1gina negra que poucos ousam falar.<\/figcaption><\/figure>\n

Entre 1877 e 1913 mais de dois milh\u00f5es de mortos<\/strong><\/p>\n

A hist\u00f3ria das secas que castigam a popula\u00e7\u00e3o do\u00a0Nordeste desde pelo menos 1877, deixou um rastro de trag\u00e9dias e mortes assombroso. Nunca foi feito um levantamento a respeito dos n\u00fameros de nordestinos que perderam as vidas por causa da\u00a0fome nestes per\u00edodos. Os levantamentos parciais, no entanto, s\u00e3o assustadores. Somente entre 1877 e 1913, portanto ainda sem os n\u00fameros da\u00a0seca de 1915, o governo federal, por interm\u00e9dio do IOCS estimava que 2 milh\u00f5es de pessoas haviam morrido em conseq\u00fc\u00eancia da mis\u00e9ria nas estiagens. Pouco mais de 100 anos depois, a equipe do livro Genoc\u00eddio do\u00a0Nordeste (organizado pela Comiss\u00e3o Pastoral da Terra e o Ibase, entre outras organiza\u00e7\u00f5es) repetiu o desafio de contar as v\u00edtimas da\u00a0seca e chegou ao n\u00famero de 3,5 milh\u00f5es de mortos somente no per\u00edodo entre os anos de 1979 e 1984.<\/p>\n

Esta \u00e9 uma p\u00e1gina negra da hist\u00f3ria do Brasil que pouco ou nunca se aborda. Talvez por vergonha, talvez pelo medo de reconhecer que esta solu\u00e7\u00e3o final adotada aqui no Cear\u00e1 por cearenses e contra seus irm\u00e3os acabaria inspirando mais tarde Adolf Hitler a us\u00e1-la contra os judeus que resultou no maior holocausto que se tem not\u00edcia o qual ceifou 6 milh\u00f5es de vidas inocentes.<\/p>\n

[googleMap name=”Caldeir\u00e3o de Santa Cruz do Deserto” description=”Caldeir\u00e3o de Santa Cruz do Deserto” width=”400″ height=”300″]Senador Pompeu, Ce[\/googleMap]<\/p>\n

Fonte: texto originalmente escrito por Xico S\u00e1 e adaptado e revisado por Luis Sucupira para publica\u00e7\u00e3o neste blog.<\/em><\/strong><\/p>\n

Saiba mais<\/span><\/strong><\/p>\n

Livros<\/span><\/em><\/strong><\/p>\n

Campos de Concentra\u00e7\u00e3o no Cear\u00e1 \u2013 Isolamento e Poder na\u00a0Seca de 1932, K\u00eania Rios, Museu do Cear\u00e1, 2001 – Obra de refer\u00eancia sobre o assunto, traz an\u00e1lises bem documentadas e detalhes riqu\u00edssimos<\/span><\/em><\/p>\n

Vida e Morte no Sert\u00e3o, Marco Antonio Villa, \u00c1tica, 2000 – Retrato das secas nordestinas desde o s\u00e9culo 19 e de como suas v\u00edtimas foram assistidas pelo governo<\/span><\/em><\/p>\n

O Quinze, Rachel de Queiroz, Jos\u00e9 Olympio, 2004 – A hist\u00f3ria de uma volunt\u00e1ria na ajuda a flagelados do campo de concentra\u00e7\u00e3o cearense de 1915<\/span><\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Se voc\u00ea pensava que a ideia de adotar os campos de concentra\u00e7\u00e3o como solu\u00e7\u00e3o final foi executada pela primeira vez pelos nazistas, enganou-se. No Cear\u00e1, 28 anos antes de Hitler, essa foi uma solu\u00e7\u00e3o elaborada pelo governo para evitar que flagelados famintos fugindo do sert\u00e3o semi-\u00e1rido chegassem a Fortaleza. <\/p>\n","protected":false},"author":22,"featured_media":214879,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"site-sidebar-layout":"default","site-content-layout":"default","ast-global-header-display":"","ast-main-header-display":"","ast-hfb-above-header-display":"","ast-hfb-below-header-display":"","ast-hfb-mobile-header-display":"","site-post-title":"","ast-breadcrumbs-content":"","ast-featured-img":"","footer-sml-layout":"","theme-transparent-header-meta":"","adv-header-id-meta":"","stick-header-meta":"","header-above-stick-meta":"","header-main-stick-meta":"","header-below-stick-meta":"","footnotes":""},"categories":[10,367],"tags":[969,57,1334,610,1173,1338,1473,453,1476,454,1491,1493,572,82,1332,896,1333],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/210363"}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/users\/22"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=210363"}],"version-history":[{"count":20,"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/210363\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":210387,"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/210363\/revisions\/210387"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/media\/214879"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=210363"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=210363"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.luissucupira.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=210363"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}