J\u00e1 ouvi dizer que se voc\u00ea n\u00e3o usa colete n\u00e3o ser\u00e1 um motociclista ou motoclubista. Mas a coisa n\u00e3o \u00e9 bem assim. Usar colete quer dizer que voc\u00ea \u00e9 um motoclubista, que seu motoclube tem estatuto, que possui regimento interno, que possui uma declara\u00e7\u00e3o de originalidade de marca e que todas esses novos integrantes tiveram que passar pelo caminho que passam prospects ou pr\u00f3speros, meio-colete ou meio-escudo e por fim escudado ou coletado.<\/p>\n
Essa categoriza\u00e7\u00e3o deve ser estimulada pelos seus benef\u00edcios e nunca pela ideia de exclus\u00e3o. Motoclubismo n\u00e3o pode ser excludente. Ele deve ser estimulado pelos benef\u00edcios e n\u00e3o pelo fato de que se for motoclubista ser\u00e1 um verdadeiro motociclista. Eu n\u00e3o vejo isso como algo que agregue.<\/p>\n
N\u00e3o \u00e9 bem assim. Como j\u00e1 disse aqui, em artigo (Se n\u00e3o est\u00e1 no papel, n\u00e3o vale!) a maioria n\u00e3o est\u00e1 formalizada e sem formaliza\u00e7\u00e3o as regras perdem for\u00e7a e com elas qualquer argumenta\u00e7\u00e3o.<\/p>\n
Separar motociclistas nas categorias motociclistas independentes e motociclistas coletados \u00e9 desconhecer todos os outros tipos de motociclistas existentes hoje no meio. H\u00e1 o mototurista, o independente (ali\u00e1s, todos somos independentes at\u00e9 que optamos por vestir determinadas cores ou n\u00e3o), o motoclubista, o motogrupista, o confr\u00e1rio e o fraterno (irmandades). H\u00e1 ainda o motociclista profissional que pode ser o policial ou militar motociclista, mototaxista e motofretistas. O que fazer dos pilotos de esportivas que apenas correm nas pistas? O pessoal do Moto GP n\u00e3o \u00e9 motociclista por que n\u00e3o \u00e9 coletado? Aqueles que praticam o off-road e o motocross n\u00e3o seriam motociclistas tamb\u00e9m? E os clubes de propriet\u00e1rios de motos da marca Harley-Davidson e Indian? Agora, qual a diferen\u00e7a entre eles? Fora a categoria e o que cada um faz, na realidade todos realizam suas atividades atrav\u00e9s da motocicleta, portanto, s\u00e3o todos motociclistas. Uns por profiss\u00e3o, por esporte e outros por paix\u00e3o.<\/p>\n
Temos a mania de categorizar e setorizar nossos grupos para assim acreditar que se estamos todos acreditando e defendendo a mesma coisa estaremos protegidos. Ledo engano.<\/p>\n
O motociclista independente ou n\u00e3o escudado, ou ainda n\u00e3o coletado, na realidade, \u00e9 t\u00e3o motociclista quanto algu\u00e9m que usa colete. Isso n\u00e3o \u00e9 regra de nada, pois todo dia, neste mundo de meu Deus, um motoclubista est\u00e1 sendo expulso ou punido por algum motoclube por que n\u00e3o respeitou as regras (quando elas existem) ou desrespeitou o escudo.<\/p>\n
O escudo representa uma filosofia, regras e cren\u00e7as, valores e \u00e9tica e acima de tudo respeito e defesa das normas e das cores do clube. S\u00f3 isso. Ele n\u00e3o diz se voc\u00ea \u00e9 ou n\u00e3o um motociclista, exatamente por que, para ser um escudado voc\u00ea precisa ser um motociclista e aqui voltamos aos independentes.<\/p>\n
Ainda existem aqueles que falam da tradi\u00e7\u00e3o do motoclubismo de raiz e do que ser\u00e1 ser um verdadeiro motociclista. Aqui outro exagero. A hist\u00f3ria do motoclubismo come\u00e7a depois da hist\u00f3ria do motociclismo e a motocicleta, quando nasceu, era um meio de transporte. Depois passou a ser usada como equipamento de guerra tamb\u00e9m. Mais tarde virou esporte nas corridas e no motocross (categoria inventada na Europa) e depois, s\u00f3 depois, motoclubes que na realidade s\u00e3o equipes e ou agrupamentos de pessoas em torno de objetivos comuns.<\/p>\n
A hist\u00f3ria mostra que o motoclubismo come\u00e7ou no Brasil quando a primeira associa\u00e7\u00e3o, fundada em 1927, foi o Moto Club do Brasil, sediado na Rua Cear\u00e1, no estado do Rio de Janeiro. Alguns anos depois, mais precisamente em 1932, surgiu o Motoclub de Campos (www.motoclubdecampos.com.br). E talvez seja este o mais antigo MC que se tem not\u00edcia no mundo.<\/p>\n
Ao contr\u00e1rio do que muita gente imagina as Motormaids M.C. s\u00e3o sim o motoclube (certificado e com carta patente) mais antigo inclusive que o mundialmente famoso Hells Angels M.C., que teve origem em 1947, e mais ainda do que os OUTLAWS MC.<\/p>\n
L\u00e1 fora, nesta \u00e9poca (D\u00e9cada de 30\u2019) estavam surgindo motoclubes com tend\u00eancia mais r\u00edgida e muitos acontecimentos vieram a expor a imagem do motociclista ao rid\u00edculo principalmente pela imprensa sensacionalista da \u00e9poca, que acusava os motociclistas de arruaceiros, desordeiros e outros superlativos. Mais tarde, algumas produ\u00e7\u00f5es de Hollywood serviram para incentivar verdadeiros desordeiros a criarem motoclubes e formarem gangues. Tal fato fez da d\u00e9cada de 50 a p\u00e1gina negra na hist\u00f3ria do motociclismo. Mas isso aos poucos est\u00e1 mudando, pena que ainda somos confundidos com arruaceiros que aparecem em encontros fazendo bagun\u00e7a do tipo estouro de escapamento, borrach\u00e3o com pneu (burnout) etc.<\/p>\n
J\u00e1 na D\u00e9cada de 60\u2019 as motocicletas voltaram a ser tema de Hollywood com Elvis Presley, Roustabout e Steve McQueen com \u201cA Grande Fuga\u201d, uma s\u00e9rie de filmes que chegou ao seu auge com \u201cEasy Riders\u201d. Finalmente inicia-se a mudan\u00e7a da imagem do motociclista com o in\u00edcio da sua fase rom\u00e2ntica, que perdurou at\u00e9 o final da D\u00e9cada de 70\u2019. Este per\u00edodo fixou o motociclista como \u00edcone de liberdade e resist\u00eancia ao Sistema. No Brasil, nessa \u00e9poca, surgiu em S\u00e3o Paulo-SP o Zapata MC (1963) e j\u00e1 no final da d\u00e9cada, no Rio de Janeiro, o Balaios MC (1969) grupo este que j\u00e1 seguia os novos padr\u00f5es internacionais e o princ\u00edpio de irmandade.<\/p>\n
A partir da d\u00e9cada de 70 viu-se a implanta\u00e7\u00e3o de diversos motoclubes pelo mundo, a maioria j\u00e1 seguindo o princ\u00edpio de hierarquia e irmandade. No Brasil a populariza\u00e7\u00e3o iniciou-se na D\u00e9cada de 90\u2019, quando da libera\u00e7\u00e3o da importa\u00e7\u00e3o pelo governo do ent\u00e3o presidente Collor.<\/p>\n
Provavelmente (porque n\u00e3o \u00e9 reconhecido pela AMA-USA) o primeiro motoclube americano apareceu ap\u00f3s a Grande Depress\u00e3o e se mant\u00e9m vivo at\u00e9 hoje: o Cook Outlaws M.C. (1936). Esse grupo era radicado em Cook, cidade de Illinois, e mantinha seu territ\u00f3rio at\u00e9 Chicago. O Cook Outlaws M.C. tornou-se mais tarde o Chicago Outlaws MC e hoje \u00e9 conhecido como Outlaws Motorcycle Club (www.outlawsmc.com) ou Outlaws MC.<\/p>\n
O primeiro colete assinado de que se tem not\u00edcia foi, provavelmente, o s\u00edmbolo dos Outlaws M.C. Ele era gravado na parte de tr\u00e1s dos coletes e consistia simplesmente no nome do clube; as vestes e os revestimentos de couro, assim como o escudo e s\u00edmbolos de cada fac\u00e7\u00e3o n\u00e3o existiam nessa \u00e9poca. \u00c9 interessante notar que, de acordo com o site do Outlaws M.C., o logotipo do motoclube (isto \u00e9 \u201cCharlie\u201d, um cr\u00e2nio centrado sobre dois pist\u00f5es e bielas cruzadas, similares \u00e0 bandeira do pirata Jolly Roger) foi influenciado pelo vestu\u00e1rio do filme \u201cThe Wild One\u201d, estrelado por Marlon Brando em 1954.<\/p>\n
A revista Life, em 21 de julho de 1947, aproveitando o momento, publicou um artigo usando a mesma foto do motociclista b\u00eabado com o seguinte t\u00edtulo: \u201cEle e os seus amigos aterrorizam a cidade\u201d (Cyclist\u00b4s Holiday: He and Friends Terrorize Town). O artigo afirma que \u201cquatro mil membros de um motoclube eram respons\u00e1veis pelo tumulto.\u201d Mais do que um exagero essa afirma\u00e7\u00e3o era uma deslavada mentira, pois nenhum motoclube havia conseguido juntar pelo menos a metade desse n\u00famero, naquela \u00e9poca.<\/p>\n
Bastaram apenas 115 palavras colocadas logo abaixo de uma imagem gigantesca de um motociclista b\u00eabado para causarem tumulto por todo o pa\u00eds. Alguns autores afirmaram que a AMA liberou para a imprensa uma nota que desmentia a sua participa\u00e7\u00e3o no evento de Hollister (CA) e indicava que 99% dos motociclistas eram pessoas de bem, cidad\u00e3os cumpridores da lei, e que os clubes de motociclistas da AMA n\u00e3o estiveram envolvidos na baderna. Por\u00e9m a Associa\u00e7\u00e3o Americana do Motociclista n\u00e3o tem nenhum registro de tal nota. A revista Life publicou o coment\u00e1rio de pelo menos tr\u00eas pessoas, uma delas era Paul Brokaw, um proeminente editor de um peri\u00f3dico chamado Motorcyclist. Brokaw bate forte na Revista Life considerando que a imagem publicada era totalmente descabida e mentirosa. De nada adiantou. O estrago estava feito e sob protesto alguns motoclubes assumiram que eram o 1% que a AMA n\u00e3o citou.<\/p>\n
O conflito do Vietnam (1958-1975) pode ser visto como um dos fatos mais recentes que contribu\u00edram para o aumento dos Outlaws Motorcycle Clubs. Se o retorno dos veteranos da Segunda Guerra Mundial foi um fator que auxiliou na forma\u00e7\u00e3o desses motoclubes, o conflito do Vietnam foi a p\u00f3lvora que faltava para explodirem. Veteranos desse conflito eram humilhados pela popula\u00e7\u00e3o em geral.<\/p>\n
Chegaram a ser rotulados de \u201cbeb\u00eas assassinos\u201d. Alguns receberam cusparadas e xingamentos nos aeroportos e, muitas vezes, foram recusados em bons empregos, isso ap\u00f3s \u201cterem cumprido com o seu dever\u201d para com o pa\u00eds.<\/p>\n
No meio dessa confus\u00e3o surgem os motoclubes 1%. Eles emergem em uma escala nacional tendo como suporte o surgimento dos Outlaw Motorcycle Clubs. Para concretizar este nascimento, os clubes dominantes da \u00e9poca foram al\u00e9m. Observando a declara\u00e7\u00e3o atribu\u00edda a AMA (de que os arruaceiros eram apenas 1%), buscaram para si a responsabilidade de fazer parte daquele 1% que foi apontado em Hollister. Assim, criaram a organiza\u00e7\u00e3o sem regras expl\u00edcitas, n\u00e3o alinhada a AMA, ou seja, assumidamente Outlaw Motorcycle Club, e passaram a se identificar por meio de um emblema em forma de diamante com a inscri\u00e7\u00e3o 1%. Concordaram tamb\u00e9m em estabelecer limites geogr\u00e1ficos ao qual cada MC teria dom\u00ednio.<\/p>\n